Ilsinho recorda transferência do Palmeiras para o São Paulo no futebol brasileiro

Esse aí é bom, sim, mas o melhor aqui é esse lateralzinho A frase foi dita para um homem de meia-idade à paisana nas arquibancadas do antigo Parque Antártica. Ele tinha ido ao jogo do Palmeiras B para observar um jogador e decidiu testar a popularidade do jovem com a torcida. Mas, então, começou a prestar atenção no tal “lateralzinho”. E nem teria como fazer diferente, na verdade. Naquele dia, só Ilsinho jogou. O Palmeiras B atuando totalmente penso para o lado direito e foi um show do lateral. E vai ficar sem contrato daqui três meses, acredita? Milton Cruz sorriu. Ele contou isso pra mim depois. Estava almoçando lá perto do Parque Antártica e ligaram para ele avisando que ia ter jogo do menino que ele ia ver em cerca de uma hora. Ele ficou lá para acompanhar. Daí em diante eles começaram a pesquisar mais sobre mim contou Ilsinho em entrevista ao UOL. Passado algum tempo, Ilsinho já jogava no time profissional e seu pai foi chamado para uma reunião. O lateral já era querido pelo torcedor e estava na mídia, participando de programas esportivos. Uma carreira que começava a despontar e já atraía interesse. A proposta feita pelo Palmeiras para renovar o vínculo foi considerada boa em relação ao salário de jogador de base que ele ganhava, mas o pai de Ilsinho tinha em mãos uma oferta melhor vinda da Espanha. Ele pediu a palavra e avisou: ‘temos uma proposta melhor’. Pega o seu jogadorzinho e leva embora daqui, vende para outro lugar foi a resposta do diretor do Palmeiras na época Relacionadas Leila cobra punição a diretor do São Paulo por xingamento a Abel: ‘Inveja’ ‘Decepcionados’: Choque-Rei do veto estremece relação entre Casares e Leila São Paulo leva multa de R$ 5 mil por barrar sala para coletiva do Palmeiras O pai de Ilsinho fechou a cara. Ao chegar em casa, deu seu conselho ao filho: “se você quiser ficar, você fica, mas se depender de mim, você nunca mais pisa naquele lugar.” Eu não sei se ele achou que estávamos blefando, não sei se ele estava puto aquele dia, não sei. Uma das coisas que herdei do meu pai foi o rancor. O cara falou isso, meu pai chegou em casa e falou ‘eu lavo minhas mãos. No desenrolar das coisas, você vê que não deram a mínima pra você e fica meio bravo, frustrado. Acabei recebendo uma proposta melhor da Espanha e estava indo. Quando estava para assinar, recebi a proposta do São Paulo, eles igualaram e eu fiquei no Brasil. Ilsinho ‘pulou o muro’ do CT e trocou o Palmeiras pelo São Paulo. O jovem lateral passava todos os dias em frente ao CT do rival durante os dez anos que ficou no Verdão, via a estrutura melhor do Tricolor na época e os atletas do último ano de base indo embora de carro, enquanto eles iam pegar o trem. A decisão de Ilsinho, porém, não foi perdoada pelo torcedor palmeirense. O lateral foi alvo de ameaças e andou por três meses com segurança particular disponibilizada pelo São Paulo. Um dia, chegou em sua casa e encontrou a residência pichada. O São Paulo adiantou um dinheiro que tínhamos combinado para que eu pudesse dar entrada em um apartamento e me mudar com minha família. Minha irmã teve que se mudar também porque descobriram onde ela morava. O lateral fez carreira no Tricolor paulista, foi bicampeão brasileiro, chegou à seleção, foi para o Shakhtar Donetsk e venceu a Liga Europa, algo impensável na época para o clube. Aos 30 anos, pensou em aposentar, mas se aventurou nos Estados Unidos e até hoje mora na Philadelphia. Me falaram que nos Estados Unidos a situação financeira era diferente, que não iria ganhar bem igual ganhava. Respondi, ah, tô tranquilo, leva eu pra lá que eu quero morar nos Estados Unidos. Desde 2016 eu não ganho um salário de jogador porque aqui tem várias regras. Eu ganhava meio que para pagar as contas, viver tranquilo. Fiquei aqui, encerrei e a gente não quer sair daqui. Hoje, Ilsinho tem uma escolinha de futsal, fez um curso de licença de técnico de futebol e está terminando um mestrado em Sports Directorship em uma universidade inglesa. Ele pensa em seguir carreira como diretor esportivo, mas, de preferência, nos Estados Unidos. O ex-jogador também tem se aventurado como streamer e abriu seu canal de análises de jogos no YouTube, a ‘IlsinhoJrTV’. Temos uma raiz aqui, são sete anos e adoramos. Eu viso ser diretor da academia do Philadelphia Union, sei lá, ou do primeiro time ou algum outro por aqui. É networking, né. Mas se tiver uma oportunidade no Brasil, não posso falar não. Se eu puder escolher, a gente chega ali em 10% do Casimiro, aquela audiência e tudo, e continuo falando de futebol e fazendo alguma coisa extra, aí é melhor ficar aqui na minha cadeira. Se pintar uma oportunidade no meio do caminho pra ser executivo no futebol em um projeto que valha a pena, tudo é conversado. Confira outras histórias de Ilsinho em entrevista ao UOL: Ser streamer “Cara, eu sempre gostei desse mundo dos esportes, gamer e tal. Durante um tempo, ainda jogando, eu tentei fazer umas lives de Call of Duty, mas para chamar a atenção, você tem que ser bom, e eu não era tão bom assim e parei. Mas fiz amizades na época e a gente continuou jogando e conversando pelo Discord. E aí, trocando ideia lá, a gente começou a assistir aos gols dos jogos do São Paulo e eu escutava os comentários de torcedor que fica na cadeira de bar, que acha que o cara que entra faltando dez minutos é fácil, tem que correr pra caramba, mais que os outros. E eu comecei a explicar as coisas para os caras. Nisso eles sugeriram: por que você não tenta ser youtuber para falar de futebol? Não tem nenhum jogador comentando na internet, só na TV. De começo eu não queria, já estava fazendo muita coisa. Eu tenho uma escolinha de futsal, eu estou fazendo um mestrado numa faculdade lá na Inglaterra, eu estava terminando meu curso de treinador aqui nos Estados Unidos, e, cara, em inglês ainda parece que o cérebro consome mais da capacidade, ele parece que às vezes ele está grande, assim, você começa a parar de pensar. Eu falei que se eles me ajudassem a escolher a pauta, editar os vídeos, ajudar nas redes sociais, essas paradas, eu até faria. Eles toparam ajudar e aí a gente começou. Cada um pega um pouquinho do tempo livre que tem. A gente às vezes grava 1h da manhã aqui, que é a hora que eu volto do treino de futsal, que são 3h da manhã aí. Eles ficam me esperando. Às vezes tem um só disponível e fazemos em dois, às vezes tem os cinco e vai todo mundo. Comecei a falar de futebol meio que numa mistura de gíria dessa galera games e gíria dos boleiros. Estou tentando decifrar para essa galera que só assiste futebol. É meio complexo e eu preciso melhorar ainda minha comunicação, mas a receptividade está sendo legal. Eu sou zero métrica, mas eles falam que tem tantos inscritos e tantas views, que é muito.” Pautas do canal “Eu não sou clubista. Por mais que eu tenha um carinho enorme pelo São Paulo, que o torcedor são-paulino tenha um carinho muito grande por mim, e isso me pegue muito, eu não consigo ser clubista. Eu tenho que falar, certo ou errado, bem ou mal, o que eu vejo. Hoje meu canal é mais são-paulino, mas a gente está tentando entrar nos outros clubes. Confesso também que, como os vídeos que dão mais views são de São Paulo, acaba sendo mais São Paulo, mas a gente está tentando meio que ir furando a bolha pra tentar falar de todos os clubes.” Os parceiros “Ninguém é da bola. Um engenheiro, um é produtor de um funkeiro, o outro é um menino que a gente conheceu quando começou, que está muito dentro das páginas do São Paulo, aí ele se mostrou disponível a ajudar, e o outro é um que está fazendo faculdade de ciências da computação. Cada um entende de uma coisa. Um faz uma arte, outro edita um vídeo, outra fica mais no Twitter respondendo, dando atenção. Às vezes eu fico lá também, mas a rede que mais fico é o Instagram, que é 100% eu.” Cursos “Por ter jogado mais de 5 anos na MLS, eles deixaram começar direto na Licença B. Fizeram um curso só para os jogadores, nas férias e tal. Terminei, mas treinador é uma coisa que não tenho intenção. Eu gosto do embate de ideia, de gerenciar conflito, tumulto, então eu pretendo seguir para a área de diretor esportivo, que é meu mestrado: Sports Directorship. Posso ser diretor esportivo em qualquer esporte ou área, estou no penúltimo módulo. Acho que dentro de campo me trouxe conhecimento e temos poucos ex-atletas sendo diretor. Sei que às vezes o atleta que é diretor fica de mãos atadas, por hierarquia e tal, mas eu acho esse conhecimento de dentro de campo aplicado no extracampo pode fazer um bem maior do que ser só treinador, sabe?” Caio Paulista “Naquela época (saída do Palmeiras para o São Paulo), a decisão foi exclusivamente minha. Eu decidi ir porque eu tinha essa vontade de jogar lá. Durante anos eu passe na frente do CT do São Paulo e vi a estrutura que era melhor. Acabei me decepcionando com as pessoas que dirigiam o Palmeiras, coloquei todo mundo no mesmo pacote e falei besteira do clube. O torcedor que é muito apaixonado levou para o coração e eu demorei algum tempo para entender que o torcedor e a entidade não tinham culpa de nada, só essas pessoas que acabaram fazendo isso. No caso do Caio Paulista, acho que a decisão não foi total dele. O São Paulo comeu bola no prazo para pagar, o Palmeiras inflacionou a proposta e para o Fluminense era melhor vender o cara para a melhor oferta financeira. Acredito que todo profissional vá querer ganhar mais em uma outra empresa. Meio que isso facilitou as coisas. Pintaram ele de traidor, mas eu acho que foi um pouco de cada um ali, todos têm porcentagem na decisão. Você vê o Palmeiras com estrutura que foi criada, disputando títulos, não vejo ele com uma decisão errada nem precipitada. Até porque eu fiz a mesma coisa, seria hipocrisia falar que eu fiz certo e ele errado.” Garrafada de Muricy “Foi um Palmeiras e Ponte Preta no Morumbi. A gente estava bem, era líder do campeonato e a Ponte estava brigando para não cair. Era casa cheia. Na época, a gente fazia muitos gols nos jogos. Era 3 a 0, 4 a 1, 5 a 1 e a gente pegou a Ponte Preta e todo mundo imaginou que seria um jogo fácil. Acabou não sendo um jogo fácil, a gente tomou 1 a 0 no começo do segundo tempo e era daqueles dias que dá tudo errado. Eu fui tentar dar um elástico meio que na frente do Muricy e errei, estourou o elástico. O bicho ficou bravo, cara. O bicho chegou no vestiário falou ‘seu moleque do caralh*” e jogou uma garrafinha de água em mim. ‘Você nunca mais faz isso!’ Surpreendentemente ou não, o jogo seguinte foi contra o Santos na Vila e acabou entrando o drible no canto. E aí ele falou para mim ‘você é abusado, tomou uma dura na quinta-feira e no domingo, na casa dos caras, que era um jogo 10 vezes mais difícil, você me vai e faz a mesma coisa estando 0 a 0?’. A gente nem estava ganhando. Falei que tinha vindo na cabeça e era o recurso que eu tinha ali no canto. Ele falou que podia me dar outra dura, mas quem está com medo de ir no banheiro nem come comida. Eu nunca tive medo assim, até porque não tem tempo de pensar. Vem na cabeça e ou faz ou não faz. Você tem meio segundo para decidir aí o drible acabou entrando. O elástico foi no Kléber e quando eu era pequeno era corintiano e fã dele. Eu, com todo respeito, tinha pedido pra ele no começo do jogo para trocar a camisa. Ele falou ‘vamos, sim’. Cara, começou o segundo tempo, o Kléber me deu um soco no estômago… Ele ficou bravaço, acabou o jogo e nem olhou pra mim. Aí eu pensei: ‘mano, já tomei um soco na barriga, não sou eu que vou lá pedir a camisa pra ele, não’. Depois a gente jogou junto no Inter e ele é uma pessoa fantástica. Só que é um competidor nato, fica bravo de perder no futevôlei dentro do vestiário. Ficava transtornado.” Mkhitaryan no Shakhtar “Mkhitaryan só jogava com a gente porque ele era técnico, mas tinha um poder físico impressionante. Não era normal. Depois dos 40 do segundo tempo ele ligava o turbo e corria mais. Ele tinha um recorde de gols no campeonato depois dos 85 minutos, era absurdo. Ele não parava de correr, era coisa de louco. E os caras têm uma história lá que teve um dia que ele acordou e do nada não conseguia andar. Ele dormiu, acordou e não conseguia andar. Ele ficou um tempo meio que recuperação, assim. Aí, depois, ele acabou operando púbis também lá no Shakhtar. Ele voltou correndo 10 vezes mais do que corria.” EUA “É que tem o ‘salary cap’, um teto máximo de salário para gastar, mais os Designated Players, que aí são três por time e pode pagar o que quiser. Os outros têm que respeitar as faixas salariais. É muita coisinha que no basquete, futebol americano, funciona, mas para nós que viemos de outra cultura de futebol, é diferente. A galera que tentei trazer para cá, os caras queriam 50 mil dólares por mês (risos). Falei, vocês não estão ligados. 50 mil dólares por mês é quase um Designated Player aqui. Aí os caras falam ‘você é louco, não vou sair daqui do Brasil que eu ganho mais’. Eu respeito, só estou tentando fazer uns negócios, mas a galera acha que estou tentando ganhar, sei lá, acham alguma coisa, mas quem entende mesmo é só quem já jogou na MLS. Acho que o salário máximo é 800 mil dólares por ano, que dá 66 mil dólares por mês, dá uns R$ 300 mil. Pra um jogador top do time, tá? Tentei trazer uns amigos, mas aqui eles contratam muita gente da Costa Rica, Guatemala, Venezuela e tal, os moleques vêm para ganhar tipo 7, 10 mil dólares por mês. Aí vem um zagueiro de 33 anos querer ganhar 50 mil dólares por mês? Os caras não aceitam. E dependendo da cidade você ainda tem que pagar 50% de imposto. É um dos motivos que eles não conseguem montar grandes times. Nem sei como o Inter Miami consegue ter Messi, Suárez, Busquets, Alba e agora o Matías Rojas.”

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